terça-feira, 9 de junho de 2009

Uma inglesa no Porto - 2º Capítulo

Estava tudo mudado. Tinha mudado de país, tinha abando­nado os meus amigos, tinha deixado a minha casa, tinha alterado o modo como falava com as pessoas que achava que estavam abaixo de mim na cadeia alimentar… Esse Isaac por exemplo… Em Lon­dres, se o visse na rua, mesmo numa total aflição, nunca falaria com ele… Apesar de ser bastante jeitoso, tinha um aspecto pobre, nunca chegaria a saber o tão simpático quão ele era. Os meus pais estavam contentes comigo. Diziam que eu tinha perdido a mania da superio­ridade e que isso era muito bom quer para mim, quer para as pessoas ao meu redor. Realmente eu começava a notar. As pessoas já não falavam tanto mal de mim nas costas como antigamente, como tam­bém nunca mais tinha ripostado mal aos meus pais. Seria más com­panhias que tinha tido em Inglaterra? Tudo isto para mim, ficaram perguntas sem solução… Nem hoje sei, porque fui alguma vez assim: arrogante… Sim! Uma menina mimada e arrogante com todos à sua volta.
Olhei para o tecto do carro e em seguida para as luzes da cidade do Porto. No carro estava um silêncio arrepiador. E já farta de estar calada e decidi falar sobre qualquer coisa! Nem que fosse o quão odeio bifes com batatas fritas! Felizmente, não estava tão desesperada por um pouco de conversa e comecei a falar sobre o tempo que se faria sentir no dia seguinte:
- Hoje eu e o Isaac passamos por uma loja de electrodomés­ticos que tinha umas televisões na montra a dar no canal de meteo­rologia e disse que no Porto, amanhã ia estar um sol incrível…!
- Esse Isaac, hã? – Ripostou a minha mãe – parecia bom rapaz…
- Pois… mas estava a pensar: que tal amanhã darmos um pas­seio à beira rio? – Desviei o diálogo – Ou então podíamos almoçar num desses restaurantes lindos com vista para o rio… Que dispõe do tão apreciado vinho do Porto e de outras iguarias. Que acham? Ia ser um dia a não esquecer!
- Eu cá acho esse Isaac, muito interessante! Sabia a história toda do Porto! Os jogos mais importantes, o número de taças que ganhou, o número de vezes que foi campeão…! – Ao dizer isto, o meu pai visualizou-me pelo espelho retrovisor e sorriu.
Eu sei o que andavam a tentar fazer! É o que toda a gente tenta, pensando que somos distraídos e que nos vamos descair. Desde que tive o meu primeiro namorado aos nove anos que sabia o que isso queria dizer… “Vai filha! Ele é um bom partido!”, “Ele é tão bom rapaz, filha! Se tivesse a tua idade…” ou até mesmo as frases que eles tinham referido nestes dois minutos atrás, podiam servir de exemplo! Os pais e os outros familiares são tão manhosos! Mas, uma coisa que vou desde já avisar: de mim não levam nada!
- Bem, Kate… - balbuciou a minha mãe - …eu e o teu pai arranjámos um apartamentozinho, que achamos bom e que acabamos por comprar a pronto dinheiro. Esperamos que não te importes!
- Obviamente que não me importo! Se não comprassem, onde dormiríamos, esta noite?
Os meus pais esboçaram um sorriso e dirigiram-se para a nossa nova casa. Quando chegamos perto do prédio, onde iríamos habitar, parei e vislumbrei-o com cuidado, dava a sensação de ser recente devido às cores ainda não terem sido comidas pelo sol. Tinha um amarelo bastante alegre revestindo o prédio na parte exterior e uma porta de ferro verde, com uns botões com códigos que permi­tiam aceder ao prédio quando nos esquecíamos das chaves. Este apa­relho era bastante útil, mas ao mesmo tempo bastante perigoso, pois corríamos o risco de sermos assaltados… pronto… Tinha chegado à minha nova casa… Estranhamente já estava toda mobilada. Foi então que os meus pais me explicaram que tinham dito que tinham exigência por uma casa já mobilada. Então tinham-lhes arranjado esta. Nada mau, pensei. Esta habitação era muito mais pequena do que aquelas que alguma vez tínhamos tido, mas, servia bem para os três.
Sentei-me no sofá amarelo, a condizer com os cortinados da sala e abri o portátil, conectei-me à internet juntamente ao Mensse­ger e rezei que o Matt se encontrasse online. Felizmente, estava e então, entrei numa conversação com o mesmo. Tinha tantas sauda­des dele. Saudade, que palavra tão portuguesa… Um sentimento… Que eu saiba só existe esta palavra para dizer que sentimos sau­dade…. Em inglês: I miss you. Era verdade: I missed him – sentia a falta dele ou tinha saudades dele… E não tinha vergonha de o admi­tir.
Comecei a conversa a dizer o quanto gostava dele e sentia a falta dele, enquanto o visionava pela webcam. Ele, inesperadamente estava mais sério que o habitual, não sorria, nem sequer se ria como um louco com as minhas piadas rotineiras.
Foi aí que vi que algo se passava com ele. Não havia a per­feição que estava habituada. Nós éramos o par mais apreciado no colégio, eu tinha arrecadado do título de rapariga mais gira do colé­gio e ele, o de rapaz. Éramos tudo isso e nem a distância nem nada nos ia separar… Tínhamo-nos prometido que quando eu fizesse dezanove anos de idade, iria ter com ele a Inglaterra. Mas, tudo se desmoronou de repente quando ele me disse que já tinha uma namo­rada nova e que já tinha ido à história, que fazia parte do passado, como se tudo o que tínhamos tido não tivesse passado de um tre­mendo erro. As lágrimas escorreram-me pelo rosto abaixo, não podia controlar, ainda bem que não tinha ligado ainda a minha webcam. Não que­ria que ele visse no estado em que me tinha deixado. “Não chores” disse-me ele. Então, senti-me extremamente humilhada e respondi-lhe que não chorava por rapazes que tinham a mania que eram bons e bloqueie-o. Não o queria ver mais. O que lhe diria se ele se cruzasse comigo na rua, agarrando a outra pela cintura ou pondo-lhe o braço direito por cima como me fazia a mim? Será que fingia que não o via e mudava de passeio, ou seria eu a ignorada? Senti um nozinho na garganta de infelicidade… Quando dei por mim, dei graças por estar no Porto e não na minha Terra Natal e correr o risco de o encontrar com a outra.
Agora sem o Matt, nada me prendia a Londres. Não tinha amigos verdadeiros, nem namorado, não tinha família… Quando pensei nisso senti-me extremamente sozinha. Não tinha ninguém, apenas os meus pais. A minha arrogância tinha-me afastado de todo o mundo, tinha criado uma barreira para com as pessoas que não considerava do meu nível e isso reflectia-se no meu número de ami­gos. A Candy, a minha melhor amiga, nunca tinha querido saber de mim, por aquilo que era, mas sim, pelo meu dinheiro. A esta altura já devia ser a cadelinha de estimação da Marie, a outra miúda mais popular. Mas, nada disso importava. Tinha acabado de decidir que a minha vida em Londres, seria como o meu telemóvel que tinha ido à máquina de lavar e que tinha avariado, tinha tido o final da sua curta “vida” e que tinha tido de comprar um novo… Neste caso, tinha que arranjar uma vida nova! E disso não ia desistir!

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